Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos
O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS
08/06/2009
Massacre no Peru tem mais de 40 mortos
Mesmo sem Bush, a águia predadora segue seu vôo pela América Latina, na parceria com as elites locais. Agora é no Peru, cujo governo entreguista de Alan García se recusa a rever os acordos fechados com os Estados Unidos, o mal fadado TLC (Tratado de Livre Comércio) que permite a ocupação de terras dos povos originários naquele país. Por 56 dias as comunidades indígenas da Amazônia peruana realizaram dezenas de atos e protestos exigindo do governo a revogação de uma série de leis que eliminam direitos e permitem a ocupação das terras comunais com o respectivo parcelamento. Tudo isso sem a consulta aos povos indígenas tal qual assegura a constituição peruana. Ou seja, os protestos das gentes são pelo prosaico cumprimento da carta magna. A lógica assumida pelo governo de Alan Garcia, com a aplicação do acordo de livre comércio, é a de entregar as terras peruanas para empresas estrangeiras em nome do "desenvolvimento" do país. Hoje, 72% do território da Amazônia peruana já vêm sendo explorado na produção de hidrocarbonetos. As comunidades não querem este tipo de desenvolvimento.
Pois como as populações originárias decidiram lutar pela revogação dos decretos que, inclusive, violam a constituição, o governo usou da violência para desbaratar as paralisações que se faziam na região. Na semana passada, um contingente policial cercou uma manifestação de quase duas mil pessoas que estavam mobilizadas na localidade de El Frontón. As estradas foram bloqueadas, ninguém podia passar pelos caminhos e a rádio informava que os soldados estavam atirando, matando gente e colocando em sacos para jogar no rio. Houve muito desespero na cidade de Bagua e isso causou mais reação da comunidade que decidiu se somar aos protestos que até então eram protagonizados pelos indígenas.
A ação da polícia provocou uma rebelião em toda a cidade. O povo indignado tomou às ruas, o centro da cidade, os edifícios públicos, e insistia para que a polícia saísse do lugar. Mas o que aconteceu foi o contrário. Mais tiros, mais mortos e mais violência. Em Lima, o governo respaldou a ação policial dizendo que ela foi necessária para "restabelecer a ordem". O que não dizem é que a desordem foi provocada pela própria polícia, uma vez que nestes mais de 50 dias de protestos, todos foram pacíficos. Foi a ação militar e as mortes que indignaram as gentes.
Com a cidade levantada em rebelião até um helicóptero foi usado, disparando indiscriminadamente contra a população civil. Segundo relatos que chegam das rádios comunitárias, crianças foram baleadas, hospitais foram invadidos e mais de quarenta pessoas foram mortas, incluindo 11 policiais. Há muitos indígenas presos e outros foram levados para cidades vizinhas e ninguém sabe o que lhes aconteceu. A situação ainda é muito tensa na região. Até os feridos que estavam sendo cuidados no hospital foram retirados de lá pela polícia e levados para a prisão.
As causas
A luta das comunidades indígenas se faz contra dois decretos editados em 2008 pelo presidente Alan García - Lei Florestal e de Fauna Silvestre e a Lei de Recursos Hídricos - que simplesmente tiram das comunidades o controle sobre os recursos naturais. Para se ter uma idéia da posição governamental, o ministro do Meio Ambiente chegou a declarar nos jornais que "os índios tem a terra superficial, mas o que está no subsolo é de todos os peruanos". O que ele não disse é que esta riqueza do subsolo, de todos os peruanos, é explorada por empresas estrangeiras que levam do Peru todas as riquezas.
Os protestos das comunidades indígenas conseguiram abrir uma mesa de negociação, mas as reuniões caminhavam de uma para outra sem qualquer resultado prático. Na semana passada, o congresso, a partir da bancada governista, decidiu postergar ainda mais o debate sobre a questão, o que provocou os levantamentos na cidade de Bagua. Mas, as mobilizações têm acontecido há mais de 50 dias em toda a região amazônica.
A ação da polícia na última sexta-feira foi mais uma destas ações arbitrárias e irracionais do governo, uma vez que há menos de duas semanas ali mesmo, naquele país, foi realizada a V Cúpula dos Povos de Abya Yala, na qual as comunidades originárias de todo o continente reiteraram a proposta de lutar contra toda a forma de neocolonização imposta pelos governos na senda dos tratados de livre comércio com os Estados Unidos.
A violência
O que aconteceu na cidade de Bagua, quando a polícia investiu contra a população civil, nada mais é do que mais do mesmo. Ao longo destes 500 anos de dominação das elites brancas ou criollas, as comunidades originárias foram solapadas, dominadas, destruídas. Mas, agora, no alvorecer no século XXI, estas gentes têm reagrupado forças, estão unidas em toda Abya Yala, recuperam sua fortaleza. Não aceitam os tratados firmados sem sua participação, não aceitam ser tratados como animais. Querem dignidade e querem seus direitos respeitados. Os tumultos que terminaram com dezenas de mortos na pequena cidade da selva peruana não foram causados pelos povos autóctones.
Eles apenas exerciam seu sagrado direito de manifestação. A polícia peruana, a mando dos governantes, fez o que sempre foi feito contra aqueles que querem discutir e construir outra forma de organizar a vida: violência. E, aquilo que era um movimento pacífico virou uma rebelião. Agora, como também sempre ocorre, as vítimas são as que amargam as prisões e os mortos serão chamados de baderneiros. Apenas os policias que perderam a vida nesta ação insana serão lembrados como heróis.
A reação
Mas, para as comunidades que iniciaram esta luta de resistência há meses, o que aconteceu em Bagua não encerra o assunto. Entidades ligadas aos direitos humanos, organizações indígenas e outros movimentos populares pedem a ação de toda a gente em frente às embaixadas do Peru. Em protesto contra o massacre e na luta pela revogação das leis que entregam o território aos estrangeiros. Também pedem que seja realizado um julgamento do governo de Alan Garcia por crime contra a humanidade. É hora, pois, da solidariedade concreta.
Por: Elaine Tavares
Fonte: AmbienteJá/Adital