Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos
O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS
08/07/2009
Justiça Federal decide a favor de "fogo zero" no Acre a partir de 2012
A Justiça Federal no Acre determinou que as autoridades dos governos federal e estadual que fiscalizam crimes ambientais adotem providências para acabar com o desmate da floresta amazônica com o uso do fogo. A técnica é muito utilizada para preparar o solo usado nas atividades de agricultura e pecuária.
O juiz David Wilson de Abreu Pardo, da 1ª Vara Federal, em Rio Branco, decidiu que o Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) só poderá autorizar concessões para o emprego do fogo apenas para a implantação de agricultura familiar e sempre em extensão inferior ao limite de três hectares por propriedade ou produtor rural, se este detiver mais de um imóvel.
A ação civil pública ajuizada no Acre e a decisão são inéditas na história jurídica brasileira. A ação foi coordenada pelo procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, com auxílio da procuradora de Justiça Patrícia de Amorim Rêgo e da promotora Meri Cristina Amaral Gonçalves. A ação poderá servir de precedente para a proibição definitiva das queimadas na Amazônia.
A decisão da Justiça Federal atende parcialmente ao pedido de antecipação de tutela contido na ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Estado (MPE) para determinar que o poder público impeça gradualmente o uso do fogo na região.
O magistrado também decidiu que o Imac poderá autorizar concessões para o emprego do fogo, a partir de 2010, apenas para implantação de agricultura familiar de subsistência e sempre no limite de até um hectare por propriedade.
A partir de 2011, o Imac terá que negar autorizações para queima na região do Vale do Acre. No ano seguinte, o órgão terá que negar autorizações para queima em todo o território do Estado do Acre.
De acordo com a decisão do juiz federal, fundamentada em 60 páginas, o Ibama e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade terão que negar autorizações para queima em unidades de conservação ou em suas zonas de amortecimento.
O Incra, o governo estadual e as prefeituras terão que apresentar, no prazo de 60 dias, suas opções quanto ao modo de subsidiar (por meio de oferta de tecnologias apropriadas, processo educativo e outras formas de pulverização) o aceso a métodos alternativos ao emprego do fogo, afim de assegurar a transição entre a agricultura itinerante e intensiva.
David Pardo exige que as propostas tenham a forma de planos detalhados de cumprimento da obrigação reconhecida, discriminando metas e prazos a serem alcançados, com a necessidade de tudo ser comprovado nos autos, ao final de cada semestre, a partir de dezembro.
O juiz também homologou um acordo firmado entre o MPF e MPE com os municípios de Epitaciolândia e Rio Branco, capital do Acre. Ambos foram excluídos do polo passivo da ação civil pública.
"Governo da floresta"
Controlado pelo PT há três mandatos consecutivos, o governo estadual se opôs ao "fogo zero" no Acre com a alegação de que o pedido do MPF viola o princípio da independência entre os poderes, porque pressupõe forte ingerência do Pode Judiciário na deliberação de políticas públicas. O Ibama chegou a interpor um agravo de instrumento contra a decisão que rejeitou a preliminar de ilegitimidade por ele arguida.
Mas o juiz entendeu que a utilização do fogo deve pelo menos progressivamente ceder espaço a formas de manejo agrícola e pecuário que minorem os efeitos dela decorrentes.
- Por isso se pode afirmar, no âmbito do direito legal, que não há direito à queima, mas, em verdade, vinculação da Administração à proibição de tal prática continuar adiante, dadas as peculiaridades locais reinantes - assinala Pardo.
Segundo juiz, existem argumentos de ordem constitucional para concluir pela rejeição do uso do fogo nas práticas agropastoris exercidas no seio da Floresta Amazônica.
- Até porque a manutenção do bioma amazônico integra o patrimônio fundamental de todos os membros da comunidade jungida pela Constituição, e as atividades econômicas que importem em exploração dos recursos naturais devem satisfazer este anseio preservacionista, elegido como primar pelo consenso fundador engendrado, em detrimento da exaustão destes recursos no imediatismo da irracional exploração.
O juiz afirma que o emprego do fogo na agricultura e pastagem é irracional. É prejudicial ao produtor rural porque extenua a terra, empobrece o solo, limita seu período de produtividade e perpetua a monocultura temporária.
Também é prejudicial à população local, que sofre, durante o período seco, com a poluição atmosférica e o acometimento de doenças respiratórias graves, que resultam em mortes. E é prejudicial, ainda, ao meio ambiente com a supressão da biodiversidade florística e faunística que caracteriza a floresta amazônica, a redução do seqüestro de carbono e, em contrapartida, o reforço à emissão deste mesmo poluente, além da exasperação do risco de propagação de incêndios.
- Nas circunstâncias, o princípio constitucional da precaução impõe à Administração Pública a obrigação de evitar danos graves e injustos, um dever de agir preventivamente, não podendo invocar imunidade por razões de conveniência ou oportunidade (discricionalidade) - afirma o juiz federal.
Alternativa
Nos autos constam quatro alternativas à utilização do fogo nas práticas agropastoris, que permitem recuperação e conservação de solos alterados ou degradados pela sistemática queima.
1. Adubação orgânica: concerne à utilização de leguminosas, como a mucuna-preta. São fontes de nitrogênio e matéria orgânica. Permitem a emergência de nutrientes de profundas camadas do solo. Reduzem o impacto das chuvas sobre a superfície do solo e minimizam os efeitos dos processos erosivos, além de representar baixo custo aos produtores.
2. Adubação química: embora eha custo elevado, exija prévia análise da composição do solo e ofereça risco de contaminação de mananciais, sua correta utilização possibilita a adequação das propriedade do solo às necessidades das culturas que se pretende implantar, além de permitir a imediata semadura.
3. Mecanização agrícola: possibilita o preparo da área sem utilização do fogo, promovendo a descompactação do solo e a construção de terraços em nível ou desnível. Permite a construção de sistemas radiculares e o melhor aproveitamento dos recursos hídricos, evitando a lixiviação e a ausência de germinação.
4. Sistemas agroflorestais ou silvipastoris: consiste no consórcio, rotativo ou não, de pastagem com o plantio de árvores ou leguminosas, e de culturas com exigências nutricionais diferentes que, além de acrescer propriedades ao solo, recompondo-o e conservando-o, diversificam as fontes de renda do produtor, o que reduz a pressão sobre as áreas ainda não cultivadas.
Por: Altino Machado
Fonte: Terra Maganize/Amazônia.org