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Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos

O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS

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15/07/2009

Mercado de carbono é importante, mas não reduziu emissões no planeta


Henrique Cortez, amigo e parceiro do IHU, conversou com a IHU On-Line, por telefone, sobre como funciona o mercado do carbono atualmente. Ele explica, nesta entrevista, como estão sendo realizadas as negociações dentro do chamado "sistema de compensação". Embora reconheça que é necessário, pois remunera quem deixa de desmatar ou degradar o meio ambiente, Cortez acredita que o mercado do carbono ainda tem inúmeros problemas, além de não ser efetivo, uma vez que não diminui a quantidade do gás na atmosfera. “O mercado do carbono no mundo, de 2008 para 2009, subiu mais de 100%. Estamos falando de um mercado que, neste ano, movimentou quatro bilhões de toneladas de carbono, o que equivale a um bilhão de árvores da Amazônia”, chamou a atenção o ambientalista.

Henrique Cortez, cientista social pela Universidade de São Paulo, com especialização em gerenciamento de riscos ambientais pela Northwest University/EUA, é coordenador do Portal EcoDebate.

Confira a entrevista.

IHUnisinos - Como o senhor vê o elo entre a diminuição da emissão de gases-estufa do desmatamento e sua transformação em créditos de carbono vendidos no mercado?

Henrique Cortez – Pessoalmente, sou muito crítico aos mecanismos de compensação de emissão. Até acho que eles são necessários, mas não são suficientes. Quando o REDD (Redução de Emissão por Desmatamento e Degradação) foi pensado, nós imaginávamos que era algo feito para preservar a floresta em pé, ou seja, o mecanismo de pagar os serviços ambientais da floresta que hoje estoca carbono. Mas ele não é assim.

E como ele funciona?

Cortez – Ele é um mecanismo de incentivo, ou seja, permite que um país ou uma empresa compense suas emissões e compre créditos, pagando por um serviço de alguém que está reduzindo o desmatamento ou a emissão de carbono pelo não manejo do solo ou pela não degradação de outra área qualquer. Na prática, esse sistema tem uma injustiça intrínseca nele, pois remunera aquele que é um desmatador, ao invés de remunerar quem preserva o meio ambiente. Por exemplo, no caso do Brasil, se isso funcionasse por estado, o Mato Grosso, como um imenso desmatador, seria remunerado por esse sistema, para não desmatar mais. Quem preserva de forma intensa, não ganha remuneração alguma. O problema é que, primeiro, esse sistema é compensatório, e, de verdade, ele não remunera a preservação.

Qual o risco do estoque de carbono que está nas florestas?

Cortez – Hoje, os estoques das florestas são grandes. Eu diria que há três grandes estoques (e isso significa bilhões de toneladas) em três sumidouros. Em primeiro lugar, há no subsolo oceânico. Em segundo lugar, nas áreas permanentemente congeladas do Ártico. E, em terceiro lugar, nas florestas. Nesse momento, o Brasil é o quarto maior emissor de CO2 no mundo, se for considerado o desmatamento e a queimada. Com isso, há um risco muito grande. As queimadas e o desmatamento liberam uma quantidade gigantesca de carbono na atmosfera. É claro que tem que ter a certificação e a remuneração pela redução de emissão por desmatamento. Esse é um mecanismo importante para evitar que a floresta seja derrubada. Entretanto, é estranho remunerar alguém para que faça o que deveria fazer de qualquer forma, ou seja, a floresta não precisa ser derrubada para a produção agrícola. Quem faz agricultura, que é a emissora de carbono pelo manejo inadequado do solo, não precisa receber remuneração para fazer manejo adequado. Ela deveria fazer isso naturalmente.

O que significa o mercado do carbono no contexto do Brasil?

Cortez – No momento, o grande mercado do carbono, segundo o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, tem acontecido essencialmente nos aterros sanitários, que possuem grandes quantidades de resíduos orgânicos e que vão se transformar em metano. Então, hoje, vários projetos de aterros sanitários estão prevendo que esse metano seja capturado e transformado em energia. Ora, mas se queimarmos metano, será produzido carbono. No entanto, o metano na atmosfera é um gás com importância no aquecimento 20 vezes maior do que o carbono. Portanto, reduzir metano, mesmo emitindo carbono, ainda é uma vantagem. Esse tem sido o principal mercado de carbono no Brasil, hoje.

Quais as desvantagens desse sistema de compensação?

Cortez – Para você ter uma ideia, o mercado de carbono no mundo, de 2008 para 2009, subiu mais de 100%. Estamos falando de um mercado que, neste ano, movimentou quatro bilhões de toneladas de carbono, o que equivale a um bilhão de árvores da Amazônia. É uma compensação importante, mas não reduziu em nada o carbono produzido no planeta. Então, o estoque de carbono na atmosfera continua crescendo. Portanto, de novo, a compensação é necessária, mas não é suficiente.

E esse sistema tem vantagens?

Cortez – Ele é necessário. Na reunião do G8, os líderes das maiores economias reconheceram o óbvio, ou seja, nós não vamos mais conseguir evitar um aumento de dois graus centígrados até o final do século. Na verdade, já em 2050 chegaremos a esse aumento. Só que dois graus centígrados já causarão um severo caos sistemático, como a destruição de 70% dos corais (um grande impacto nos sistemas marinhos e nos estoques pesqueiros); ciclos muitos intensos de seca nas regiões subtropicais; elevação do nível do mar em um metro (o que significa que 10% do estado da Louisiana/EUA vai ficar embaixo d’água e que Nova Orleans desaparecerá). Por isso, em primeiro lugar, temos que reduzir as emissões. Isso é fundamental. Segundo, temos que sequestrar, ou seja, reduzir a quantidade de carbono que já está na atmosfera. O carbono fica lá por mais de cem anos, portanto a quantidade que está na atmosfera hoje terá impactos por mais de um século ainda. A única maneira de evitar isso é tirar o carbono da atmosfera.

A preocupação com o carbono é tão grande, mas o que deve ser feito em relação ao metano?

Cortez – O metano é uma tragédia. O grande problema desse gás é que não temos como neutralizá-lo, hoje. Os grandes estoques de metano, atualmente, estão no solo congelado do Ártico e no fundo do oceano. Já há, hoje, um crescimento muito grande, na ordem de 2% ao ano, da emissão de metano só pelo descongelamento do solo do Ártico. Quando a temperatura está aumentando, este solo – que está congelado a dezenas de milhares de anos – está voltando às condições de um solo normal e acaba liberando o metano que estava congelado. Então, o aquecimento aumenta a emissão de metano, e quanto mais metano emitimos, mais aquecemos. O metano que está no oceano está preso por causa da pressão e da temperatura. Mas se o oceano aquecer muito, algo como 2 graus centígrados (o que equivale a um aumento de 6 graus centígrados na atmosfera), nós caminhamos para um apocalipse climático. É uma armadilha que não tem solução hoje. A única maneira seria reduzir brutalmente o aquecimento. Assim, esta é uma questão sem resposta.

E o que o G8 e o G20 precisam negociar nesse sentido?

Cortez – Eles precisam negociar um plano de metas de redução honesta, porque o que está sendo discutido nesses incontáveis “convescotes” internacionais são planos que não resolvem nada, embora todo mundo saia comprometido. Até Copenhagen teria que ser assinado um plano de metas de redução de emissão. Os Estados Unidos, há dez dias, aprovou sua legislação de metas e esta é uma questão complicada, porque eles vêm seguindo essa legislação – que é um avanço em relação ao “desgoverno” Bush – que prevê que, em 2020, reduzirá suas emissões para os níveis de 2000. Ora, o Protocolo de Kyoto previa que se tivesse como meta as emissões de antes da década de 1990. Em 2000, as emissões estadunidenses eram 25% maiores do que dez anos antes.

E podem sair de lá propostas efetivas para resolver o problema?

Cortez – Não. E não vai ter no futuro. Pelo menos até 2020. Explico: Nos Estados Unidos, 52% da produção de energia elétrica é baseada em termelétricas à carvão. Lá, as reservas de carbono são suficientes para eles usarem durante mais de 400 anos. É uma indústria de carbono que emprega um milhão de pessoas. Primeira dúvida: os EUA vão substituir o carvão por qual outro recurso? Energia nuclear? Vamos fazer de conta que isso aconteça. Para isso, o país terá que construir, até 2050, duas usinas nucleares por ano e isso não ninguém consegue. Segunda questão: como um presidente, qualquer que seja ele, vai chegar para a população e dizer que vai acabar com o mercado em que a maioria trabalha? Esse é o mesmo problema da Europa.

Então, para onde nós caminhamos?

Cortez – Nós caminhamos para uma solução. Agora, nossa espécie tem uma característica que é a de só tomar decisões traumáticas quando está na beira do abismo. A China é o país que mais investe em energias limpas no mundo. Ninguém constrói energia eólica, por exemplo, na quantidade e na velocidade como a da China. Mas esse é um processo que pode levar até 50 anos para começar a substituir a geração termoelétrica a carvão. Cada um dos países precisa repensar seu modelo de desenvolvimento. Cada um precisa reorganizar suas economias para que fiquem mais verdes. Além de serem processos longos, isso pressupõe uma negociação interna, pois será preciso substituir empregos e sistemas de produção. É complicado. Eu diria que até 2020 vamos ficar só no discurso. Até lá, algumas tecnologias novas, talvez, sejam consolidadas, como os processos de sequestro de carbono.

Fonte: AmbienteJá/ IHUnisinos


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