Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos
O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS
24/11/2010
Metas ameaçadas, mas ruralistas atacam
Brasília - Coincidentemente nesta terça, dia 23 de novembro, dois estudos foram apresentados sobre as consequências e os efeitos da aprovação, ou não, das alterações no Código Florestal Brasileiro. Um, mais geral, com dados de diferentes órgãos como IGBE e Embrapa, foi apresentado em audiência pública na Câmara dos Deputados, convocada pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural a pedido do deputado federal Paulo Piau (PMDB/MG). O outro estudo, ainda com dados preliminares, foi realizado sobre um ponto específico da discussão pelo Observatório do Clima, que é constituído por 36 organizações não governamentais (ONGs) e institutos ambientais do país.
A pesquisa realizada pelo Observatório revela que a aprovação do Projeto de Lei 1876/99, que prevê, entre outras coisas, a anistia a desmatadores e a redução de 30m para 15m as Áreas de Preservação Permanente (APP) em matas ciliares de rios com até 5 metros de largura, compromete gravemente a meta brasileira de redução de emissões estipulada na Política Nacional de Mudanças Climáticas (1 bilhão de toneladas até 2020). Com as mudanças, estima-se que cerca de 7 bilhões de toneladas de carbono acumuladas sejam lançadas na atmosfera, o que representaria 25,5 bilhões de toneladas de gases do efeito estufa, mais de 13 vezes as emissões do Brasil no ano de 2007.
Segundo os dados, ainda, a isenção de manter e recuperar áreas de reserva legal em pequenas propriedades rurais (até quatro módulos), outra das medidas previstas, é a que tem maior impacto potencial nas emissões e deixaria uma área total de 69,2 milhões hectares sem proteção, extensão maior do que o estado de Minas Gerais. De acordo com André Ferretti, coordenador do Observatório do Clima, o estudo contempla apenas uma das diversas facetas das propostas de modificação do Código Florestal.
Na Câmara, professor convidado defende relatório
Para o debate na Câmara foram convidados representantes da academia e cientistas como os professores do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, Sebastião Valverde; e do Centro Universitário do Oeste Paulista, Luis Carlos Moraes, mas apenas este último esteve presente na audiência.
Moraes questionou as críticas feitas por uma parcela dos especialistas da ciência, que chamou de “academia ruidosa”, e defendeu as alterações na legislação. Segundo ele, é preciso “desvendar alguns mitos”, como o da anistia a desmatadores: “Não existe nesse projeto anistia a desmatadores. O texto apenas reproduz algumas anistias já previstas na legislação brasileira. A diferença é que aqui o desmatador é quem faz sem licença, diferente das autorizações dos órgãos ambientais”.
De acordo com o professor, dados da Embrapa revelam que 37% das propriedades brasileiras são somatório de APP + reserva legal, em lugares como o Pantanal chega a 97%. “Pela atual legislação ambiental, restariam apenas 29% do território nacional para a produção agrícola. Os demais 71% estão comprometidos com áreas de proteção permanentes (APPs), de reserva legal, unidades de conservação e terras indígenas. Pouco mais de ¼ do território para produção, isso é sustentável a médio e longo prazo?”, questionou.
Ele afirma que na análise da questão utilizou-se apenas o “dualismo coxo entre biologia e direito”, sendo o problema muito mais abrangente. “Diz-se que este projeto é ruralista. Mas o Ministério da Cultura, de Cidades, de Ciência e Tecnologia, de Transportes também falam que é hora de mudar, e todos eles são afetados pelo Código”, apontou.
Deve-se lembrar apenas, que o aperfeiçoamento da lei também é defendido pelos ambientalistas, mas com medidas cabíveis que consigam unir conservação e produção. Nenhuma das partes quer “o meio ambiente como barreira comercial”, como insinuou o professor.
Moraes citou também exemplos de países estrangeiros, dos quais os únicos da lista que proíbem construção em margens de rios é Brasil e Austrália, sendo que todos os demais praticamente já acabaram com suas reservas de floresta nativa.
Segundo ele, a única diferença entre a proposta do “novo” Código e o que ainda está em vigor é quanto aos pequenos proprietários. “Os arrozeiros do Rio Grande do Sul ocupam 427 mil hectares em várzeas, em Santa Catarina, 134 mil ha, o que representa 72% da plantação total de arroz tipo 1 do Brasil, que nós consumimos. Assim, somos todos partícipes ou receptadores desse crime ambiental”, afirmou.
O deputado Ancelmo de Jesus (PT/RO), que não conseguiu se reeleger nas últimas eleições, acata a ideia, por defender a “grande oportunidade de salvar a agricultura familiar e de manter os jovens no campo”.
Para finalizar sua apresentação, o professor disse ainda que “a bancada ruralista está vendendo muito barato o desmatamento zero. O que vai acontecer com o m2 na zona urbana, se isso for aplicado também lá? Qual é o preço do desmatamento zero?”. Segundo ele, a comissão acatou 70% das recomendações do Conselho Federal de Biologia. “Tem que acatar 100%? Devemos votar a matéria logo, para extirpar essa colcha de retalhos que é a legislação atual”, defendeu.
Pressa: ruralistas pedem votação no Plenário
O deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP), relator do parecer, também compareceu à audiência e frisou a sua tese de defesa aos 90% de produtores rurais que permanecem na ilegalidade. Segundo ele, “qualquer forma de supressão de vegetação significa supressão de forma de vida também, então, se pensarmos desse jeito, a humanidade é um crime ambiental”. “Dizer que esse projeto é todo ruralista é crime, má-fé ou é uma indiferença tamanha”, completou.
Também se pronunciaram, frisando a posição dos respectivos partidos, os deputados Moacyr Micheleto (PMDB/PR), Valdir Colatto (PMDB/SC), Homero Pereira (PR/MT), Duarte Nogueira (PSDB/SP) e Afonso Hann (PP/RS). Em sua fala, o ex-ministro da Agricultura, deputado federal Reinhold Stephanes (PMDB/PR), afirmou que o Congresso não toma uma decisão, “pois no fundo é urbano também, e não conhece o campo”.
Os deputados da Frente Ruralista estão numa corrida contra o tempo, já que em julho de 2011 expira o prazo do decreto federal que paralisou a plena aplicação do atual Código Florestal Brasileiro. Além disso, Homero Pereira deu outros motivos da pressa para o que chama de ações práticas: “O que queremos é votar a matéria. Houve uma renovação de quase 50% no Congresso, então temos que votar enquanto o projeto está maduro e os membros estão inteirados do assunto”.
Já o tucano Duarte Nogueira deixou à presidente eleita, Dilma Rousseff, a responsabilidade de ter, “no início de seu mandato, esse assunto resolvido”. Moacir Micheletto, que presidiu a Comissão Especial do Código Florestal, afirmou que a estratégia adotada de reunir líderes partidários tem a intenção de concluir a votação da matéria no Plenário, como está, ainda em dezembro, deixando possíveis emendas para o Senado, no ano que vem.
Fonte: O Eco/ Nathalia Clark