Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos
O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS
15/12/2010
COP-16: Com o impasse de Cancún, cientistas abandonam a ilusão de um aquecimento global moderado
A reunião de 194 países realizada em Cancún, no México, foi um marco na luta contra o aquecimento global. Infelizmente, não por avançar nas negociações de um acordo para limitar as emissões poluentes que afetam o clima do planeta. O que mudou, na semana passada, foi a posição dos especialistas em mudanças climáticas. A maioria deles já não acredita que seja possível limitar o aquecimento a apenas 2 graus célsius a mais do que a temperatura média da Terra há um século.
NOVOS CÁLCULOS
Os cientistas já perderam a esperança de que a temperatura suba só 2 graus
É esse número mágico que está por trás da tentativa de fechar um acordo em 2012 que substitua o Protocolo de Kyoto, de 1997 – que não teve muito efeito. Se todos os países conseguissem conter suas emissões, as mudanças (elevação do nível do mar, secas, enchentes etc.) seriam administráveis, por meio de investimentos em infraestrutura e avanços científicos. O aumento de 2 graus até 2100, segundo os cientistas, é o mínimo que podemos esperar, considerando a concentração atual de gás carbônico na atmosfera (40% mais do que antes da era industrial) e o que inevitavelmente será despejado na próxima década, mesmo que mudássemos a partir de amanhã todas as indústrias e atividades agrícolas.
Com o emperramento das discussões diplomáticas, a maior parte dos cientistas passou a acreditar que devemos nos preparar para uma Terra de 3 a 4 graus mais quente, no mínimo. Esse é o foco de um conjunto de estudos divulgado há duas semanas s pela Royal Society, a academia de ciências do Reino Unido (leia os gráficos abaixo). “Se tivéssemos um novo Plano Marshall (projeto de reconstrução da Europa após a Segunda Guerra Mundial) para despoluir todas as grandes economias em 15 anos, seria viável. Mas isso não vai ocorrer”, diz Mark New, da Universidade de Oxford, um dos coordenadores dos estudos.
Para piorar, o descontrole do clima é um processo difícil de ser contido, uma vez iniciado. “Se amanhã, milagrosamente, o mundo começasse a reduzir as emissões, a redução no ritmo de aumento de temperatura começaria a ser sentida em 25 ou 30 anos”, diz o climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Um aumento de 4 graus célsius em 100 anos pode parecer pequeno, mas o mundo levou 20 mil anos para esquentar 6 graus desde a última era glacial.
Em que mundo viveriam nossos filhos e netos, em média 4 graus mais quente? Para começar, seria ruim para as nações emergentes. Estudos americanos estimam declínios de 63% a 82% até 2100 na produtividade de milho, soja e algodão em países temperados. E perdas maiores nos trópicos. Países ricos, como a Holanda e o Reino Unido, já têm planos para barreiras que segurem uma elevação de 2 metros do mar. Mas isso não é opção para 8,7 milhões de pessoas que ficarão desabrigadas em áreas alagáveis da Índia, do Paquistão e até no Brasil. Segundo estudos, dois terços das consequências no mundo não podem ser evitados por medidas preventivas e resultarão em mais pobreza entre os emergentes.
O Brasil pode ter sua cota de sacrifícios. O mar poderá subir mais de 1 metro até 2100. E mais de 1,5 metro até 2200. Isso ameaçaria cidades litorâneas, como Rio de Janeiro, Salvador e Recife. Teríamos de erguer barreiras rochosas para evitar a invasão das avenidas à beira-mar. Os sistemas de drenagem de águas de chuvas e esgotos teriam de ser refeitos para vencer as marés. Alguns modelos preveem o ressecamento da Amazônia brasileira e do celeiro agrícola do Centro-Oeste. Esses cálculos ainda são incertos, porque dependem de interações complexas da atmosfera. E dificilmente os pesquisadores conseguirão um grau de certeza maior, mesmo com computadores mais possantes, por falta de referências sobre variações climáticas no passado. A opção será se preparar para o pior, com ações como desenvolver variedades agrícolas mais resistentes.
Quem vai pagar por isso? Como os países desenvolvidos foram os maiores responsáveis pelas emissões que nos colocaram na situação atual, a tendência é que assumam parte do ônus pela remediação. Até a reunião do clima do ano passado, em Copenhague, estimava-se que financiar essas adaptações custaria de US$ 40 bilhões a US$ 170 bilhões por ano. Mas isso para um cenário de 2 graus de aquecimento. Com a previsão piorada, os custos vão aumentar. E o maior desafio vai além desses recursos: trata-se de traçar planos para enfrentar as mudanças climáticas já irreversíveis sem desistir de lutar por acordos internacionais que controlem as emissões e evitem um aquecimento ainda mais drástico – que, segundo alguns cientistas, poderia até tornar o planeta inadequado para a vida humana.
Fonte: Reportagem de Aline Ribeiro e Alexandre Mansur, na Revista Época.