Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos
O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS
02/01/2009
A perspectiva de longo prazo
O próximo ano [2009] será uma narrativa de tensão: uma série de escolhas difíceis entre os imperativos do presente e os do amanhã. Como resolveremos essa tensão dará a medida de nossa visão e nossa liderança.
Como comunidade de nações, enfrentamos três provas imediatas. A primeira já começou. Não é a crise financeira global, por mais importante ela seja. Eu me refiro às mudanças climáticas, a única ameaça verdadeiramente existencial.
Temos apenas 12 curtos meses até a cúpula crucial em Copenhague, onde os líderes mundiais vão se reunir em dezembro para chegar a um acordo para reduzir o processo de aquecimento global. Precisamos de um acordo que amplie, aprofunde e fortaleça o Protocolo de Kyoto. Precisamos de um novo tratado para o século 21 que seja equilibrado, inclusivo e abrangente -e um que possa conquistar a adesão de todos os países.
Demos um passo importante em Poznan, Polônia, onde ministros e especialistas da área climática se reuniram para traçar um plano de trabalho para o futuro. As negociações foram difíceis. Elas prometem se tornar ainda mais difíceis. Alguns dos participantes argumentaram que não podemos nos dar ao luxo de tratar de mudanças climáticas em meio a nossas dificuldades atuais. Eu afirmo que não podemos nos dar ao luxo de deixar de fazê-lo. Nossa segunda prova é econômica.
Está claro que precisamos de um estímulo global. As grandes economias responderam à crise atual com ambiciosos planos de resgate fiscal e monetário. A cúpula emergencial do G-20, em novembro, mostrou que os governos estão cooperando para coordenar suas políticas. Esses esforços foram ampliados numa reunião mais recente em Doha.
Tudo isso é bem-vindo. Mas precisamos fazer mais. Sobretudo, precisamos pensar em termos novos e ousados. Se quisermos sair da crise financeira gastando, devemos fazê-lo de maneira inteligente. E isso significa que esses gastos precisam ser investimentos. Eles precisam ser sustentáveis, para que não nos limitemos a destinar dinheiro para resolver problemas mas, em lugar disso, utilizemos esses recursos para deitar as bases de um futuro mais estável e próspero.
Liderança chinesa
A China deu provas de liderança. Um terço de seu recentemente anunciado programa de estímulo econômico de US$ 586 bilhões será canalizado para o crescimento verde e a infra-estrutura. Os chineses aproveitaram uma oportunidade para fazer frente a vários desafios simultaneamente: gerar empregos, conservar a energia e combater as mudanças climáticas. Os EUA, sob Barack Obama, pretendem fazer o mesmo.
Esses formuladores de políticas públicas sabem que o investimento em combustíveis alternativos e tecnologias que não agridam o ambiente trarão recompensas futuras maciças em termos de um ambiente mais seguro, independência energética e crescimento sustentável.
Mas eles também sabem que o investimento verde pode gerar empregos e incentivar o crescimento aqui e agora. Outros países deveriam seguir esse exemplo. Não conseguiremos introduzir uma era de prosperidade sustentável sem um impulso global grande, que inclua todos os países. Se alguma vez houve um momento para uma visão ousada e ambiciosa -a oportunidade de traçar um caminho novo e melhor-, esse momento é agora. Nossa terceira prova é uma questão de princípios pragmáticos. As mudanças climáticas e as finanças globais não são nossas únicas crises. Elas vêm agravar outras ameaças: insegurança alimentar, volatilidade nos mercados de energia e commodities, e a terrível persistência da pobreza. Nenhum país foi poupado. Mas são os mais pobres que sentem esses golpes com mais força.
Se não for corretamente tratada, a crise financeira de hoje se tornará a crise humana do amanhã. A turbulência social e a instabilidade política vão crescer, exacerbando todos os outros problemas. O perigo é que ocorra uma série de crises em cascata, cada uma delas surgindo a partir da anterior, com consequências potencialmente devastadoras para todos.
Assim, durante 2009 é preciso que atuemos num espírito de solidariedade global. As medidas que tomarmos para fazer frente à crise financeira precisam atender aos interesses de todos os países, tanto dos mais pobres quanto dos mais ricos e poderosos. Os programas de assistência a países em desenvolvimento devem ser vistos como parte de qualquer plano de estímulo global e recuperação econômica de longo prazo.
Metas do Milênio
No mínimo, isso significa não usar a crise financeira como desculpa para reduzir a ajuda internacional e a assistência ao desenvolvimento. Precisamos honrar os compromissos que assumimos sob as Metas de Desenvolvimento do Milênio, vendo-os como responsabilidade pragmática, além de moral.
Neste mundo interconectado, o desafio é enxergar o nexo entre esses três conjuntos de problemas. Com visão, encontraremos soluções para cada um que sejam soluções para todos. Mas será preciso liderança para traduzir essa visão em ação, assim como será preciso liderança para contrabalançar nossos interesses maiores de longo prazo com as urgências acirradas do agora.
Por: Ban Ki-Moon, secretário-geral das Nações Unidas. Este artigo foi distribuído no fim de 2008 pelo Project Syndicate
Tradução de Clara Allain
Fonte: Folha de S. Paulo