Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos
O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS
21/01/2009
Sucesso do Plano Nacional sobre Mudança de Clima dependerá também das ações do consumidor
O Plano Nacional sobre Mudança do Clima, apresentado em dezembro pelo Governo Federal, traz uma novidade: o estabelecimento de metas voluntárias de redução do desmatamento ilegal em todos os biomas brasileiros, como Cerrado, Amazônia e Mata Atlântica. De acordo com o Plano, a meta, no período 2006-2010, é reduzir o desmatamento em 40% (em relação à média dos anos 1995-2005). Depois disso, o objetivo, até 2017, é conseguir a redução de 30% a cada quatro anos, até que seja atingido o desmatamento ilegal zero.
Nos últimos anos, representantes do governo brasileiro sempre evitaram falar em metas de redução de desmatamento. O argumento se baseava no princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, em relação ao aquecimento global. Esse princípio baseia-se no fato de que todos os países são responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento global e as conseqüentes mudanças climáticas. Os países industrializados e desenvolvidos, porém, pelo fato de emitirem muito mais, e há mais tempo, têm maior responsabilidade no aumento da concentração desses gases na atmosfera. Portanto, deveriam assumir metas de corte nas emissões — o que é previsto inclusive pelo Protocolo de Quioto —, enquanto os países em desenvolvimento, como Brasil, China e Índia, deveriam apenas implementar medidas voluntárias para reduzir as emissões, mas sem compromissos com metas.
Evitar a destruição de matas nativas é essencial para que o Brasil diminua suas emissões de gases de efeito estufa. Ao contrário dos países industrializados, nos quais a principal fonte desses gases é a queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, gás natural e derivados de petróleo) para a produção de energia, cerca de 75% das emissões brasileiras vêm de desmatamento e queimadas. Como lembrou o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, no lançamento do Plano, conter o desmatamento ilegal é um esforço de vários setores da sociedade e passa por medidas como a regularização fundiária na Amazônia e a implantação do zoneamento ecológico-econômico, um instrumento de planejamento de políticas públicas que considera aspectos econômicos, ambientais e sociais de cada região.
Ações de planejamento ou de fiscalização do governo, entretanto, não serão suficientes. Embora o Plano Nacional não tenha medidas dirigidas especificamente ao consumo, o consumidor terá um papel fundamental para que o país atinja seus objetivos. A importância das ações do consumidor em relação ao aquecimento global foi demonstrada por um estudo feito pela consultoria McKinsey, sob encomenda da Confederação das Indústrias Britânicas (CBI, na sigla em inglês). O relatório “Mudanças climáticas: um assunto de todos” mostrou que, na Inglaterra, 60% das emissões de gases de efeito estufa são controladas ou influenciadas pelos consumidores. Com base nesses dados, os planos daquele país para redução de gases de efeito estufa foram modificados, como informou Martin Broughton, presidente da CBI, durante a apresentação do relatório no Brasil. O foco principal recomendado, sobre o qual as indústrias e o governo deveriam agir, passou a ser o consumidor.
Apesar de não haver levantamento semelhante no Brasil, há uma clara relação entre consumo e desmatamento ilegal de florestas. O estudo “Conexões Sustentáveis São Paulo – Amazônia: quem se beneficia do desmatamento da Amazônia”, realizado pelas ONGs Repórter Brasil e Papel Social, mostra como o consumo da maior cidade brasileira é indutor direto das atividades econômicas na região amazônica. Muitos produtos originários da Amazônia e vendidos em São Paulo, especialmente carne, soja e madeira, não têm garantia de origem e vêm de áreas onde ocorre desrespeito à legislação ambiental e trabalhista. Mais de 80% da madeira vendida no Brasil, por exemplo, sai de áreas de desmatamento.
Ao apresentar a pesquisa durante o seminário “Conexões Sustentáveis: São Paulo-Amazônia”, realizado em São Paulo em outubro de 2008, Leonardo Sakamoto, da Repórter Brasil, destacou a responsabilidade das empresas que adquirem produtos de fornecedores ilegais. Entretanto, ressaltou a necessidade de o consumidor ter mais informações sobre a origem dos bens e serviços que compra, além da consciência dos impactos desses produtos e serviços. “O ato de comprar algo é político, pois você está comprando a forma como aquilo foi produzido”, avaliou.
Outro estudo — “A Pecuária e o Desmatamento na Amazônia na Era das Mudanças Climáticas” —, recém-divulgado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), mostra que o avanço da pecuária é o principal fator da derrubada da floresta nos últimos anos. Desde 2004, o Brasil é o maior exportador mundial de carne. O rebanho bovino brasileiro chega hoje a 207 milhões de cabeças, e foi na região amazônica que ocorreu a maior expansão dos pastos. Entre 1990 e 2005, a pecuária ocupou entre 75% e 81% do total desmatado. Um dado é particularmente revelador: o índice de desmatamento sobe e desce conforme aumenta ou cai o preço da carne.
Essa relação entre a destruição da Amazônia e o mercado levou à criação de pactos empresariais para o controle da cadeia produtiva da carne, da madeira e da soja. Lançados também durante o seminário “Conexões Sustentáveis”, os pactos prevêem que as empresas e instituições signatárias financiem, distribuam ou comercializem apenas produtos certificados ou que comprovadamente sejam adquiridos de fornecedores que não estejam envolvidos com trabalho escravo nem tenham pendências legais com órgãos de fiscalização ambiental. Além disso, é responsabilidade dos signatários fazer campanhas de esclarecimento sobre a legalidade desses produtos a seus consumidores e fornecedores. O Instituto Akatu é signatário dos três pactos, além de membro do Comitê de Acompanhamento dos mesmos.
Portanto, ao comprar carne, soja e madeira, o consumidor é o elo final de uma cadeia produtiva que pode ser ancorada nas boas práticas sociais e ambientais. Procurando obter das empresas informações sobre a origem dos produtos, e optando por aqueles que comprovadamente não venham de fornecedores que estão na ilegalidade nem contribuem para a derrubada da floresta, o consumidor colabora para a preservação da Amazônia e para que o Brasil reduza cada vez mais suas emissões de gases de efeito estufa. E o consumidor brasileiro está preparado para fazer isso: segundo a pesquisa “Como e por que os brasileiros praticam o consumo consciente?”, divulgada pelo Instituto Akatu em 2007, um em cada três brasileiros percebe os impactos coletivos ou de longo prazo nas decisões de consumo. E 43% dos consumidores usam seu poder de compra para premiar empresas que tenham práticas adequadas de responsabilidade social e ambiental.
Em relação à redução de emissão de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento global, o consumidor também pode contribuir com ações cotidianas. Pode, por exemplo, reduzir sempre que possível o uso de combustíveis fósseis, seja a gasolina do automóvel ou o gás da cozinha e do aquecimento do banho. A dica também é válida para o chuveiro elétrico — ou qualquer equipamento que funcione com eletricidade. Embora a energia elétrica no Brasil seja produzida basicamente por usinas hidrelétricas, as mesmas emitem gases de efeito estufa, e, além disso, o governo federal tem planos de construir usinas termoelétricas a gás (um combustível fóssil) para atender o crescente consumo.
Fonte: AmbienteJá/Envolverde/Instituto Akatu