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Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos

O Projeto Direito e Mudanças Climáticas nos Países Amazônicos, coordenado pelo Instituto O Direito por um Planeta Verde tem como meta fomentar o desenvolvimento de instrumentos regulatórios relacionados às mudanças climáticas nos países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, integrantes do Tratado de Cooperação Amazônica. LEIA MAIS

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10/02/2009

Melhor caminho


A erosão das terras agrícolas configura uma verdadeira tragédia ecológica. O solo, patrimônio da humanidade, esvai-se na força das chuvaradas. Muitos culpam o agricultor pelo fenômeno. As estradas, porém, representam um grande vilão.

Agrônomos conservacionistas estimam que até 50% da perda de solos em certas regiões paulistas é provocada pela água canalizada no leito das estradas rurais. Quem já trafegou pelos campos, naqueles caminhos esburacados e bem empoeirados, entende facilmente a razão.

Basta lembrar os elevados murunduns que cerceiam a via nas suas beiradas. Eles delineiam o trajeto como se definissem um rio seco. Quando chegam as torrenciais chuvas, essas altas laterais impedem que as enxurradas d?água se dispersem, canalizando-as sempre rumo à descida. Aí mora o terrível problema.

Quando naquele lugar surgiu a estrada, os veículos certamente passavam no mesmo nível da paisagem. Inexistiam os barrancos. A cada chuva, entretanto, forma-se um barreiro danado. Vem a máquina da prefeitura e aplaina o chão, retirando a terra solta. Passam os anos. O leito carroçável vai devagar se aprofundando, encaixando-se no terreno. A motoniveladora apenas penteia a estrada.

Um erro técnico básico se comete nesse processo de mecanização. Geralmente não se constroem saídas para esvair a água da chuva. Resultado: impedidas de escorrer pelo terreno, as enxurradas se canalizam dentro da estrada, avolumando-se e se tornando violentas. Quando encontram, finalmente, um sangradouro, elas descem a ribanceira destruindo o solo e derrubando o que encontram pela frente. Enormes voçorocas fendem os campos, como se cicatrizes exibissem a natureza vilipendiada.

O mal se corta pela raiz. As ideias conservacionistas, com ênfase na estrada rural, inspiraram os agrônomos da Companhia de Desenvolvimento Agrícola de São Paulo (Codasp) a desenvolverem, em 1997, um excelente programa, chamado Melhor Caminho. Sucesso total.

O programa engloba um conjunto de técnicas de mecanização agrícola, com o objetivo de impedir que as estradas favoreçam a formação das enxurradas. Começa por arrebentar os barrancos laterais, abrindo as portas para a saída da água de chuva. Canaletas se implantam para facilitar o escoamento. E na saída desses "bigodes", como os apelida o agricultor, constroem-se, afundados no terreno, grandes buracos que funcionam como caixas d?água, capazes de reter a enxurrada.

Dois efeitos fantásticos se conseguem com a técnica: primeiro, cessa o estrago causado pelas águas pluviais, seja na própria estrada, seja nos terrenos erodidos onde se esgotam. Segundo, a água retida nas caixas laterais se infiltra vagarosamente no solo, alimentando o lençol freático. As nascentes agradecem.

O Programa Melhor Caminho, administrado pela Secretaria Estadual da Agricultura, já consertou, em 11 anos, 6 mil km de vias secundárias em quase todos os municípios paulistas. Milhares de agricultores presenciaram os enormes tratores da Codasp realizarem autênticos milagres nas estradas de chão, substituindo acessos quase intransitáveis por modernas estradas. Sem asfalto, mas com boa tecnologia, perenizadas.

Agricultor acredita em São Tomé, ver para crer. No início dos trabalhos se assustam. Mas depois alardeiam a mudança verificada antes e depois do Melhor Caminho. O testemunho é dado por quem sofre há décadas, esquecido, acostumado a esperar dias até limpar o sol, para desencalhar seus veículos atolados naqueles terríveis lodaçais. Na vizinhança, cercas novas substituem o velho arame farpado, embelezando a paisagem. Melhora o transporte, valoriza a agricultura, protege o meio ambiente.

O impacto positivo do Melhor Caminho revelou-se recentemente nos bairros Palmitalzinho e Palmeirinha, localizados na divisa entre os municípios de Regente Feijó e Inhumas, lá na região de Presidente Prudente. Um grupo de 120 pequenos produtores rurais acaba de ser contemplado com as obras inauguradas na cabeceira do Rio Santo Anastácio, beneficiando 30,1 km de vias de terra, até então totalmente deterioradas.

Os técnicos da Codasp estimam, neste projeto recém-executado, que a infiltração de água, graças à sua contenção nas caixas laterais da estrada, permitirá elevar a vazão daquele manancial em 28,5 l/s, quantidade capaz de oferecer água sobressalente a 12.500 pessoas. O Rio Santo Anastácio começa a reviver. Fantástico.

Na sequência dos trabalhos de mecanização agrícola, as Secretarias Estaduais do Meio Ambiente e da Agricultura, juntamente com as prefeituras locais, Unesp de Presidente Prudente e DAEE, começaram a promover a recuperação das matas ciliares daquela microbacia hidrográfica. Milhares de mudas nativas serão plantadas às margens dos riachos e das nascentes, auxiliando a regeneração natural do ecossistema.

Nenhuma ação se configura mais necessária, hoje, no interior de São Paulo do que recuperar a vegetação surrupiada equivocadamente no passado, especialmente aquela que margeia os mananciais. Sem o colchão protetor formado pela vegetação ciliar, a erosão dos solos desaba diretamente nos corpos d?água, assoreando-os. Córregos onde no passado os agricultores se deliciavam na pesca dos lambaris e piavas, desgraçadamente, hoje são atravessados a pé, com água na canela. Fora a poluição.

O Melhor Caminho provoca uma pequena revolução na roça. Crianças deixam de perder aula na época das chuvas. Agricultores escoam sua safra sem medo do atoleiro. Prefeituras economizam na manutenção das estradas. Mananciais param de sofrer com o assoreamento. Enchentes desaparecem.

Fim da erosão. Início da agricultura sustentável.

Xico Graziano, agrônomo, é secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. E-mail: xico@xicograziano.com.br

Site: www.xicograziano.com.br

Fonte: Estadao.com.br


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