Para que o Código Florestal se torne um mecanismo eficaz para a conservação e recuperação do passivo ambiental existente nas cerca de 5,2 milhões de propriedades rurais do País, é preciso que o governo estabeleça com urgência os mecanismos financeiros que incentivem os proprietários a se ajustar à lei. Após dois anos e meio de vigência da nova lei florestal, o governo ainda não regulamentou o capítulo das medidas econômicas e financeiras para beneficiar os proprietários que cumpriram a legislação e punir os devedores.
“A sociedade espera uma resposta que sincronize as medidas administrativas, como a implementação do Cadastro Ambiental Rural, com uma estratégia de incentivos econômicos para o cumprimento da lei”, disse Roberto Smeraldi, da organização Amigos da Terra – Amazônia na abertura do seminário realizado pelo Observatório do Código Florestal na última sexta-feira em Brasília e que abriu nova agenda de debates sobre o tema. O evento reuniu a sociedade civil, pesquisadores, acadêmicos e gestores de políticas públicas.
Segundo Smeraldi, a implementação do CAR precisa dos aspectos econômicos. “O governo não pode pensar que irá criar as condições administrativas do Código Florestal e depois os incentivos. Não pode ter uma política de dois tempos, mas sim uma politica de ações paralelas”, ponderou.
No Brasil, há vários instrumentos econômicos, como a desoneração da folha de pagamento e a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados para fabricação de carros com o objetivo de manter o nível de empregos. Na área ambiental, porém, os instrumentos existentes são precários e mal administrados. Exemplo é o desconto da área de reserva legal no cômputo do Imposto Territorial Rural.
De acordo com o pesquisador Paulo Barreto, do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia –IMAZON, o potencial de cobrança do ITR para inibir o desmatamento especulativo na região amazônica. “O imposto poderia gerar milhões de reais em divisas ao poder público, que geralmente carece de recursos para a área ambiental”, disse ele durante o seminário.
Por outro lado, lembrou o pesquisador, há experiências interessantes em curso, como o programa Produtor de Águas, da Agência Nacional de Águas – ANA, que remunera produtores que preservam as nascentes das bacias hidrográficas. Todavia, falta escala para o programa fazer a diferença, especialmente em lugares críticos. E é esse cenário que o Observatório do Código Florestal quer discutir a partir de agora.
“É preciso ver onde os incentivos econômicos conseguiram mudar comportamentos no financiamento de atividades sustentáveis, pois há lições no mundo todo com as quais podemos aprender. Uma delas é que é preciso adequar o instrumento ao objetivo. E o objetivo precisa estar bem claro se não o instrumento não leva ao resultado desejado”, recomendou Ronaldo Serôa da Mota, professor de Economia e Meio Ambiente, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
Próximos passos
Para seguir com a discussão do tema, o Observatório do Código Florestal deverá realizar uma série de debates com o governo, a academia, o setor produtivo e as ONGs. Os resultados e análises desse processo deverão se tornar recomendações a serem apresentadas ao governo federal, governos estaduais e municípios com o objetivo de acelerar a implementação de incentivos e atrair os proprietários para a regularização dos passivos e aproveitamento das potenciais mercados que podem advir da implementação do Código Florestal.
É o caso das Cotas de Reserva Ambiental – CRA, um instrumento da lei que permitirá negócios a partir dos excedente de florestas nas propriedades rurais. A minuta que regulamenta esse mecanismo já foi analisada pelo Ministério da Fazenda, mas desde setembro deste ano está parada no Ministério do Meio Ambiente.
“Temos pedido ao governo que torne o processo de regulamentação do Código Florestal o mais transparente possível e essa minuta está sendo formulada sem que a sociedade possa opinar. Queremos acesso à minuta, até mesmo para contribuir com a nossa experiência”, disse Jean François Timmers, Superintendente de Políticas Públicas do WWF-Brasil.
Durante o seminário, a ONG entregou ao público uma análise com contribuições ao projeto de lei (PL) 792/2007, que tramita há sete anos na Câmara dos Deputados e que define a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais.