"Grupo chefiado por ex-conselheiro de Ban Ki-moon pretende produzir um manual para disciplinar o uso de tecnologias de modificação climática, que podem ter efeitos colaterais graves
O ex-conselheiro para mudanças climáticas de Ban Ki-moon vai liderar um projeto para desenvolver regras para a geoengenharia, em meio a temores de que os esforços atuais para retardar a mudança climática sejam insuficientes.
Janós Pásztor, que serviu com Ban de 2008 a 2012 e entre 2015 e 2016, lançará a Iniciativa Carnegie de Governança da Geoengenharia em Nova York, no próximo dia 16.
Falando desde Nairóbi, onde discute seus planos com autoridades do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), Pásztor disse que todas as opções para atacar a mudança climática deveriam ser discutidas.
“Por mais que o Acordo de Paris tenha sido um enorme passo adiante, nós sabemos que, mesmo que todos os países cumpram suas metas, ainda estamos no rumo de 3oC de aquecimento”, disse o diplomata húngaro ao Climate Home.
“Assumir que seremos 100% [bem-sucedidos no cumprimento do acordo] não é realista, e estamos dizendo que, para alcançar esses objetivos ambiciosos, precisamos pensar seriamente no que mais acrescentar a um esforço maciço de mitigação.”
“Alguns cientistas dizem que precisamos considerar o gerenciamento da radiação solar para nos certificarmos de que não iremos além de 1,5oC a 2oC [de aquecimento]. Estes são cenários plausíveis, e precisamos pensar seriamente em todas as opções.”
O termo “geoengenharia” cobre uma ampla gama de tecnologias e propostas. Estas vão desde lançar partículas finas na atmosfera para filtrar os raios solares até fertilizar os oceanos com pó de ferro para promover o crescimento de algas que absorvem carbono.
Menos empolgantes, mas mais realistas, são esquemas maciços de plantio de árvores e a captura de emissões em usinas de bioenergia, o chamado BECCS.
O problema, explica Pásztor, é que muitas dessas tecnologias têm como efeito colateral uma possível alteração do planeta, e há poucas regras hoje para os experimentos básicos.
“Não há quase nada”, ele diz, dando como exemplo o chamado Protocolo de Londres. Esse acordo regula o despejo de “materiais” nos oceanos para fins de geoengenharia, mas oferece poucas diretrizes para além disso.
No ano passado, a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica estendeu seu alerta contra a geoengenharia em grande escala, embora tenha solicitado aos países que cooperassem em futuros projetos de pesquisa sobre o tema.
“Praticamente não existe nenhuma discussão real sobre o gerenciamento de riscos climáticos. Há um debate na comunidade científica, mas não na comunidade de políticas públicas”, disse Pásztor. “É aqui que precisamos da grande mudança.”
Lançar mão de algumas tecnologias de geoengenharia poderia dar ao planeta tempo para lutar contra a mudança do clima, diz Pásztor. Mas não espere resultados rápidos.
Ele diz ver isso como um projeto de cinco anos, que o levará a diversos países para construir um quadro de como os governos enxergam essa questão premente e o que eles pretendem fazer a respeito.
Nesta semana ele se encontra com o diretor do Pnuma, Erik Solheim. A próxima parada é a Índia, para tentar entender como Nova Déli pode contribuir com a elaboração das regulações.
E há ainda uma questão bem maior no horizonte.
Países com interesse ativo em tecnologias radicais de modificação climática incluem os EUA, a Alemanha, a China, o Reino Unido e o Japão. Só que os impactos de disparar miniespelhos na atmosfera não serão iguais para todo mundo.
Um estudo de 2013 elaborado por uma equipe do Met Office, o serviço britânico de meteorologia, revelou que, embora o lançamento de aerossóis na estratosfera do hemisfério Norte possam gerenciar a radiação solar, ele também causaria uma seca maciça no Sahel.
“Geotecnologias podem produzir um bem global ao melhorar o clima… mas poderia haver impactos locais, e estes poderiam ser bem negativos. Como você lida com um bem global no qual alguns acabam sofrendo mais do que outros?”, questiona o diplomata.
“Eu poderia vislumbrar um acordo no qual nós decidíssemos fazer a semeadura de nuvens [nome dado à injeção de aerossóis na estratosfera], reconhecendo o Sahel como uma área impactada e triplicando a assistência à região para assegurar que sejam feitos poços artesianos e o que mais for preciso para contrabalançar os impactos negativos.”
Ainda assim, ele está se preparando para uma briga boa. A oposição ao uso da terra para plantio de culturas bioenergéticas nos países em desenvolvimento é intensa, e suspeitas grassam nas redes sociais sobre como e quem faria a “semeadura de nuvens” com partículas que bloqueiam a luz solar (teorias conspiratórias existem aos borbotões no Twitter, com a hashtag #chemtrails).
Muitos concordam que a prioridade deva ser investir em mitigação, o que Pásztor diz ser um “falso argumento”, já que ele também concorda que cortar carbono precisa vir em primeiro lugar. Não se trata de uma questão de “ou isso ou aquilo”, mas de uma opção que precisa estar na mesa.
“Poderia dar um respiro para a descarbonização ou assegurar que, se nós ultrapassarmos [os 2oC], não o façamos por muito tempo”, afirma. “Funcionários de governo, funcionários de agências intergovernamentais e alguns dos meus amigos conservacionistas mais malucos… todos concordam que precisamos lidar com isso.”
“Nem todos são a favor – muitos são bastante contrários. Mas todos concordam que isso precisa ser discutido, que precisamos dialogar e trazer esse assunto para a esfera política.”
Confira a matéria completa no endereço eletrônico do Observatório do Clima.
Fonte: Ed King,Climate Home/ Traduzido por Observatório do Clima